Deus que fala

Texto de Pe Mauro Odoríssio, CP

Ao ridicularizar a idolatria, as Escrituras dizem que os ídolos têm boca e não falam, têm ouvidos e não ouvem, têm olhos e não vêem (Sl 115/113B,4ss). O Senhor, ao contrário, é um Deus que fala. Ao falar, dirige-se a todos, em qualquer lugar, sempre e das mais variegadas maneiras. E o faz para ser ouvido, para estabelecer um diálogo santo e santificador com a criatura humana.

Em primeiro lugar Ele fala por meio das criaturas. Todas, das menores às maiores, proclamam o Criador, anunciam sua bondade, sua sabedoria, seu mor. O que Dele é cognoscível, o pouco que Dele podemos saber (o seu eterno poder, sua santidade, sua inteligência), Ele nos revela pela criação. Seu anúncio se difunde pelo mundo em linguagem silenciosa, mas eloquente (Sl 19/18,2-5). A existência das criaturas, a ordem e a harmonia no mundo falam do Criador (Rm 1,19ss).

Também os fatos e os acontecimentos, se bem lidos e discernidos, nos levam ao Deus que nos fala. A cura do pobre cego é um exemplo. Por ela, Jesus não quis “quebrar-lhe simplesmente o galho”, resolver-lhe o problema imediato, mas revelar a todos que O descobrissem como a luz do mundo (Jo 9,1ss). Assim, ninguém mais andaria nas trevas (Jo 8,12). Para revelar-se como a ressurreição e a vida, ressuscitou Lázaro (Jo 11,1ss). Tudo em benefício da humanidade.

Se as coisas proclamam eloquentemente o Senhor, com maior capacidade o fazem as almas que Ele enriqueceu e iluminou. Quem de nós não conviveu com pessoas, cultas ou não, que eram verdadeiras porta-vozes do céu: um pai, uma mãe, uma catequista? Quanta sabedoria, quanto testemunho de vida, quanta santidade fluíam daqueles corações! Era Deus que falava por elas.

Deus fala, ainda, pela sindérese. A palavra pode assustar. Como tal ela é um tanto desconhecida. Mas ela não nos abandona; a não ser quando a reduzimos ao silêncio, quando, sob as mais variadas desculpas, fugimos dela. Assim mesmo, sorrateiramente, ela continua insistindo. É aquela voz misteriosa, silenciosa, sempre presente, que nos repreende quando fazemos o mal, ou quando deixamos de fazer o bem. É aquele “puxão de orelha”, aquela correção que nos leva ao bom caminho. Essa voz também nos estimula a prosseguirmos na estrada do bem. Isso mesmo: nós nos referimos à voz da consciência. No fundo, é Deus que nos fala por meio dela.

Todavia, destacamos, neste momento, a Bíblia. Por meio dela, mais e melhor conhecemos o Senhor assim como ao seu projeto de salvação. É por meio dela que nos conheceremos a nós mesmos mais aprofundadamente, assim como a nossa razão de ser e o sentido de nossa vida.

A Bíblia, divinamente inspirada e sempre ao nosso alcance, é a garantia de que é Deus quem nos fala por meio dela, a ponte pela qual Ele estabelece um diálogo conosco. Dirige-se a nós tendo presente o que somos, em que estado nos encontramos, em quais circunstâncias e em cada preciso momento. Mostra-nos, por meio da história do povo santo, e pela nossa, que Ele é o Amor que nos ama (1Jo 4,8), mesmo se o céu nos parece fechado e a terra, caliginosa.

Quando, em plena aridez, duvidando de tudo e de todos, ela nos mostra que o Pai quer nosso bem e nossa felicidade plena (Jo 10,10). Que nos quer salvos e não condenados (Jo 3,16-17), elevando-nos quando caímos (Lc 15,11ss), tomando-nos em seus ombros (Jo 10,11ss), conduzindo-nos às pastagens verdejantes, defendendo-nos, fazendo de nós seus comensais (Sl 23[22],1ss). Revela, ainda, que tudo faz para que sejamos santos e realizados (1Pd 1,15-16).

Deixa-nos claro que o Pai nos acompanha com suas graças. Uma delas é a termos como luz a nos iluminar, a nos corrigir, a nos exortar e fortalecer (2Tm 4,1-2). Desvenda-nos um o amor sem medidas: precisamente quando éramos merecedores do ódio divino Ele nos amou a ponto de não poupar o seu próprio Filho que morreu na cruz por toda a humanidade (Rm 5,6ss).

As Escrituras nos orientam como viver fraternalmente na face da terra, como tratar as coisas criadas para que não nos venham a faltar, para que ninguém delas fique privado. E, como coroa de tudo, a vivermos a comunhão com Deus e com os irmãos e irmãs em vista de um mundo melhor.

E, quando queremos rezar, sem sabemos como, a Bíblia, por meio dos Salmos, coloca em nossos lábios e em nossos corações, preces divinamente inspiradas. Assim, louvamos, adoramos e agradecemos o Senhor com as palavras divinas.

Que as Escrituras nos sejam o livro aberto e iluminador neste Ano de 2012!