Texto de P. Mauro Odorissio, CP
Excetuando Deus que é a permanência no seu ser, tudo o que existe é passível de evolução ou de involução. Só o Senhor é a Santidade em si mesmo, portanto, incapaz de melhorar ou de piorar. Ele é a Perfeição e, como tal, imutável, sem um mais e sem um menos.
Então, necessariamente, a festa de Pentecostes experimentou suas vicissitudes! Começou como simples celebração agrícola, entre os judeus, passando, a seguir, por mudanças que a levaram à “sacralização”. Transformou-se numa das três principais festas religiosas do povo de Deus.
No início, os agricultores simplesmente festejavam a alegria da colheita. Porém, de imediato sentiram a necessidade de agradecer pelo dom da safra (Ex 23,16), assim como pedir chuvas fecundas para a semeadura vindoura. Depois, incluíram a oferenda das primícias ao Senhor (Lv 23,15-22). Finalmente, Pentecostes se transformou na festa dos amores: celebrava-se a aliança do povo com Deus e a caminhada amorosa no deserto. A solenidade acontecia sete semanas depois da Páscoa. Daqui o nome Pentecostes.
Da celebração judaica para a nossa houve um salto qualitativo que pede algum aprofundamento. Herdamos dos judeus a festa, mas, não é exagero dizer que a herança ficou mais no nome.
O Pentecostes cristão, ordinariamente é localizado no dia em que os judeus o celebravam. Habitantes de Jerusalém, peregrinos e prosélitos de diversos lugares do mundo se encontravam na cidade. Os discípulos do Senhor estavam em “seu local de celebração” (isso demonstra que a comunidade já tinha uma boa caminhada), quando se deu uma manifestação teofânica. Na ocasião teria acontecido o dom do Espírito Santo (At 2,1ss).
Não é de se olvidar, porém, que há referências anteriores a esse dom. Jesus, no dia da ressurreição, portanto, antes da festa de Pentecostes, já o teria concedido aos seus discípulos (Jo 20,22). Pergunta-se: por que dá-lo novamente? Em tão pouco tempo teria acontecido algum “desgaste”?
O dom do Espírito Santo é um sublime dom de Deus, mas com facetas distintas a serem consideradas, litúrgica e reflexivamente, em momentos diferentes.
Ao falarem da morte de Jesus, os Evangelistas, em lugar de dizer que Ele “expirou”, significativamente afirmam que Mestre “entregou (ou deixou) o Espírito” (Mt 27,50). Foi precisamente nesse momento, ilustrado pelo seu último “sopro”, que foi dado o Espírito Santo. Essa grande graça aconteceu na cruz. Ao morrer, Jesus vivificava a Igreja dando-lhe uma vida especial: o Divino Paráclito. O sublime “grão de trigo” fora lançado na terra e morrera; mas dele surgia a vida (Jo 12,24). Como do velho Adão adormecido saíra Eva (Gn 2,21-22), agora, do novo Adão “adormecido” na cruz, do seu lado aberto pela lança (Jo 19,34), saia a Igreja, a nova Eva, a mãe de todos os povos. Era uma nova vida a enriquecer a humanidade que surgia na face da terra. O Espírito Santo é o “sopro” vivificador na nova criação que então acontecia (Gn 2,7).
Essa vida, porém, estava ameaçada por morte hedionda: o pecado. Precisamente por isso é dito que, no dia da ressurreição, Jesus glorioso, sopra sobre os assustados discípulos e lhes dá o Espírito Santo e o poder de perdoarem os pecados (Jo 20,19-23).
Finalmente, na festa dos judeus, “no dia de Pentecostes” (At 2,1) se enfatiza que, pelo dom do Espírito Santo foi dado aos numerosos discípulos, oriundos das mais variadas regiões do mundo e com idiomas distintos, a graça viverem fraternalmente, pois eram capazes de falar a única língua inteligível por todos: a do amor fraterno. É de se acrescer, ainda, que a Igreja, pelo mesmo Espírito Santo, estava em condições de levar a todos os quadrantes, a mensagem salvadora de Cristo. A apostolicidade passou a ser-lhe inerente. Tornou-se, ainda, mãe fecunda, e em condições de acolher, em seu seio, filhos de todos os povos. (At 2,1-47).
Que Pentecostes seja, então, realmente assumido em sua potencialidade vivificadora, transformadora, dinamizadora. Que a todos conceda a vida nova e a abertura ao serviço, à apostolicidade. Que, mesmo na diversidade dos idiomas, os povos consigam falar a verdadeira língua: a da fraternidade universal, até a conquista definitiva da Pátria.