Texto de P. Alcides Marques, CP
Espiritualidade é uma dimensão humana universal e diz respeito a cada pessoa em particular. Assim como a corporeidade, a racionalidade e a afetividade, a espiritualidade é uma dimensão. Quando falamos em dimensão não estamos nos referindo a uma parte (em oposição a outras), mas a um aspecto que diz respeito à pessoa como um todo. Toda pessoa e o todo de cada pessoa tem, de certa forma, uma espiritualidade. Existe sempre algo (ou alguém) que impulsiona todas as nossas ações. O que nos diferencia enquanto cristãos é a nossa referência direta a Jesus Cristo. Quando os sentimentos, atitudes e valores de Jesus Cristo marcam decididamente a nossa maneira de pensar, sentir e agir, podemos falar em espiritualidade cristã.A espiritualidade não se reduz a oração, vai além. Em sentido cristão, a oração é o estabelecimento de uma ligação direta com Deus, um diálogo, já que o Deus cristão é revelado por Jesus Cristo como uma pessoa. Podemos dizer que a espiritualidade é a garantia da qualidade da oração, já que uma oração sem espiritualidade seria uma oração mecânica, mágica.
A espiritualidade também não se reduz a religião. Devemos entender religião como um desdobramento da espiritualidade enquanto fato coletivo – com divindade, ritos, doutrina e moral-, uma forma que as pessoas encontram para dar mais concretude à sua dimensão espiritual. Nesse sentido, a espiritualidade vai além da religião.
E em relação à compaixão? O que a espiritualidade tem a ver? Compaixão não é o mesmo que simpatia ou empatia. Em sentido etimológico, simpatia vem de “sym” (união) + pathos (sentimento) e se refere àquela pessoa que tem a capacidade de estabelecer uma ponte afeitva com outra pessoa. Já empatia vem de “In” (dentro) + pathos e se refere àquela pessoa que tem a capacidade de olhar com o olhar do outro, de perceber a vida, as pessoas e os acontecimentos com a perspectiva do outro. A mola propulsora da empatia é o olhar e o escutar do outro.
A compaixão é mais do que empatia, pois envolve uma atitude (ou conjunto de atitudes). Compaixão é “sofrer com” e tem a ver com o deixar-se afetar pelo sofrimento do outro e tomar posição a favor do outro. “Eu só peço a Deus que a dor não me seja indiferente” (Mercedes Sosa). Compaixão não é a mesma coisa que ter pena, dó, piedade. Esses sentimentos estão ligados a uma postura de superioridade diante das outras pessoas. Já a compaixão está ligada a uma postura de igualdade. A pessoa compassiva olha o outro de igual para igual. Trata-se de um Impulso de tirar o outro de uma situação de sofrimento, de dar ao outro condições dignas de vida. É por isso que compaixão envolve ação, cuidado, dedicação.
Conclusão: espiritualidade e compaixão fazem parte de um mesmo processo. A compaixão é parte essencial da espiritualidade: deixar-se conduzir pelo impulso (=espírito) da compaixão. Ter os mesmos sentimentos de Cristo (Flp 2,5-9): esvaziar-se; assumir a condição de servo (de quem deve ser servido); humilhar-se; tornar obediente (=escuta) até a morte e morte de Cruz.