Por P. Mauro Odorissio, CP
Ao escrevermos o título desta reflexão, confessamos, desde já, que não estamos plenamente satisfeitos com a forma de seu enunciado. Contudo, esperamos que, no decurso da exposição, ele fique mais explícito, mais claro.
Na manhã da 1ª Segunda Feira da 1ª Semana do Advento, rezando as Laudes, detivemo-nos, na reflexão da chamada Leitura breve: “Vamos subir ao monte do Senhor, à casa do Deus de Jacó, para que ele nos mostre seus caminhos e nos ensine a cumprir seus preceitos; porque de Sião provém a lei e de Jerusalém, a palavra do Senhor”. A passagem é de Is 2,3. Estávamos sós e pudemos nos deter à vontade e refletir.
O texto recorda uma das múltiplas obrigações dos judeus: peregrinarem ao templo de Jerusalém, tido como a morada de Deus na terra, “o monte do Senhor, a casa do Deus de Jacó”. De modo especial, por ocasião das três festas mais solenes (Páscoa, Pentecostes e Tabernáculos), eles deveriam peregrinar para a chamada casa de Deus.
O Novo Testamento diria, mais tarde, que Deus não precisa de moradia construída por mãos humanas (At 7,47-49). Ou mais precisamente: ele quer se abrigar, sim, mas no interior do coração humano (1Cor 3,16-17). E não é de se estranhar: o Primeiro Testamento contém parcialmente a revelação divina. A plenitude da manifestação amorosa da vontade santificadora de Deus dar-se-ia no Novo Testamento. Aquele era sinal pedagógico a facilitar a compreensão e o acatamento deste, isto é, o pleno querer santificador do Pai, revela por meio do Filho encarnado (Gl 4,4).
Ao completar 12 anos, Jesus passou a peregrinar, com Maria e José, por ocasião da Páscoa (Lc 2,41-42). As peregrinações eram um preceito entre os judeus, o que passou a ser hábito. Quando a religião começa a ser hábito, é sinal que começou a morrer. A vida é movimento, é crescimento ou, melhor falando, é evolução. A pedra será sempre pedra, estática, sem movimento entitativo que parte do interior. O ser humano é chamado a ser cada vez mais perfeito. Jamais deverá se contentar com o último estágio conquistado, pois é chamado à perfeição como a Pai Celeste (Mt 5,48). Tanto que o Mestre, vendo a estagnação, a exterioridade dos judeus, começou a condenar o templo como tal e a vida religiosa assumida por eles: “Jesus disse:… Está chegando a hora quando o Pai não será adorado nem sobre esta montanha e nem em Jerusalém… está chegando a hora e é agora, em que os verdadeiros adoradores vão adorar em espírito e verdade`” (Jo 4,21-24).
Mas, voltemos ao texto de Isaias acima citado. O Profeta mostra que o objetivo último não era o ir ao templo e lá exercer práticas devocionais, participar dos sacrifícios, das orações. Ao contrário, o verdadeiro e piedoso peregrino deveria, numa postura de discípulo, abrir-se aos ensinamentos amorosos de Deus e cumpri-los, bem como seguir os caminhos do Senhor, os ensinamentos divinos.
É vital, no momento, distinguir o cumprimento da observância da lei. Observar é acatá-la em suas minúcias, mas só exteriormente. Quem odeia, mesmo não matando, é um assassino, disse Jesus: “Todo aquele que odeia o seu irmão é um assassino” (1Jo 1,15). Não adianta só não matar. Os fariseus guardavam as minúcias da lei, mas apenas na exterioridade. Eram sepulcros caiados: por fora, beleza; por dentro, podridão e vermes (Mt 23,27-28).
Cumprir a lei é ir ao seu espírito, ir à profundidade de sua mensagem. É acolhê-la, vivê-la. Até os pagãos, diz Paulo, mesmo não a tendo, se viverem como se a tivessem, não precisam dos mandamentos escritos na pedra (Rm 2,14-15). O cumprimento da lei não se contenta com o mínimo; procura o máximo sem parar, sempre crescentemente. Neste caso, o seu limite é o infinito.
Agora, no período do Advento, a Igreja nos solicita a uma verdadeira preparação para o verdadeiro Natal que é ter o Deus-conosco, em nós, na nossa vida, no mundo em que vivemos.
Is 2,3 nos alerta a não nos iludirmos, nem supervalorizarmos as práticas exteriores; estas, existindo, que procedam de um coração aberto ao bem, à verdade, a Cristo. Que estejamos, então, como diz o Profeta, abertos aos caminhos e aos ensinamentos do Senhor. Em outras palavras, que “não estejamos em”, isto é, no praticismo, na exterioridade de uma vida religiosa morta, “mas, para”, isto é, abertos ao infinito, como deseja dizer o título que escolhemos.
Que o Avento do presente ano, se torne dinâmico e iluminador.