Texto de P. Mauro Odorissio, CP
De imediato, após a ressurreição de Jesus, os Apóstolos passaram a anunciar que ele fora predito pelos profetas, que morrera na cruz, mas que ressuscitara. Portanto, que todos se preparassem para o grande encontro final com ele. Esse foi o centro, o núcleo da pregação apostólica. Só mais tarde foi sendo dado a conhecer o resto da mensagem evangélica.
Isso fez com que muitos pensassem que o “fim do mundo” estava às portas. Tanto que alguns, a partir de então, deixaram de trabalhar para se prepararem para a iminente hecatombe final. Ante isso a igreja, porém, foi alertada a se organizar, a viver e a irradiar a mensagem salvadora no mundo todo, pois a caminhada seria longa e árdua. Aos que deixaram de trabalhar, então, que também não comessem (2Tes 2,1-4; 3,6). Todavia, pregava-se que na morte e ressurreição do Mestre já se faz presente, na terra, uma vida especial. Na ressurreição dele está a nossa: real, concreta.
As Escrituras insistem que quem participa da morte do Senhor, participa, igualmente, de sua ressurreição. Pelo batismo morremos e somos sepultados em Cristo e assim, já na terra, partilhamos, igualmente, de sua glória, de sua ressurreição (Rm 6,3-11). Nesse contexto, se compreende como Jesus, ao morrer, disse ao Bom Ladrão que naquele mesmo dia ele o teria consigo no paraíso, sem ter que esperar pelo juízo final ou algo semelhante (Lc 23,40-43).
Então, quando se dará a nossa ressurreição? No “final do mundo”, como aprendemos quando crianças e que continuamos a ouvir no nosso dia a dia? Ou, como o Bom Ladrão, de certa maneira, já a temos em nós, participando, então, da glória com o Mestre?
Col 2,12 afirma que quem é sepultado no batismo passa a participar da ressurreição do Senhor. Entre ele e os seus já acontece uma união indissolúvel. A Epístola em sintonia com Rm 6,4ss, mas, mais do que ela, insiste numa ressurreição que “já” se faz presente em nossa vida. Para Romanos, o que se concretizará no futuro é chamado de manifestação da vida. É interessante observar como “ressurreição e vida” se identificam em Jesus (Jo 11,25).
Col 3,1-4 deixa claro que a ressurreição escatológica, a do “final do mundo”, de certa maneira já chegou e com isso é de se procurar as coisas do alto mais do que as da terra. Houve uma passagem da morte para a vida que está escondida com Cristo em Deus. Aplenitude e a perenidade dessa vida não atingiram, ainda, a imortalidade, mas também, não é mero sonho. É de se observar que o Apóstolo usa o verbo ressuscitar no passado: “já ressuscitastes”. Ela é a semente que traz em si a “dínamis”, a força, e a quase concretitude de um futuro definitivo quase ao alcance das mãos. Daqui o título de nosso estudo: “ressurreição já, mas ainda não”. Trata-se da ressurreição incoativa, a que já começou e que pulsa em nossos peitos. Ela não é uma quimera, mas algo concreto e presente. Vive-se, então, já na terra, uma realidade que será perenizada no além, na chamada ressurreição escatológica, a que aprendemos no catecismo, a que revela a definitiva vitória do bem sobre o mal.
A ressurreição incoativa não é mero sonho ou simples projeto; trata-se de uma pequena posse da glória definitiva, a chamada ressurreição escatológica. Tanto que o discípulo, com tal vida pulsando no peito, mesmo palmilhando pelas estradas deste mundo, tem os olhos voltados para as coisas do alto. Se os pés ainda estão nesta terra, a mente, a vida e o coração estão mais no céu do que aqui. O mundo terreno, para ele, vai sendo construindo e vivido na perspectiva, na luz e na quase posse do definitivo.
Esse modo de ser e de viver revelam a passagem da morte para a vida (Col 3,3). Essa nova existência, ainda escondida em Cristo, um dia será revelada e possuída plena e definitivamente. O que ainda está velado aos olhos humanos se tornará luz translúcida sem ofuscar os do coração. O discípulo que morreu e ressuscitou em Cristo, atingirá a plenitude eterna no Senhor.
Neste “já, mas ainda não’, é do cristão ir se despindo do homem velho e ir vestindo o novo, procurando, assim, as coisas do alto (Col 3,1). Até quando Deus será tudo em todos (1Cor 15,28).
Então, na ressurreição do Senhor, o discípulo já tem uma nova vida, a ressurreição incoativa que, no final de sua existência terrena, será definitiva: a ressurreição escatológica.
Que o Senhor nos fortaleça nessa sublime caminhada: “já, mas ainda não”!