Ecos da Trindade

Texto de P. Mauro Odorissio, CP

Festa da Trindade. Após a missa um casal, na sacristia, me perguntou se eu tinha cópia do sermão que fizera. Brincando respondi: “Paganini jamais bisa”. Ante interrogações, expliquei que o célebre violinista, num de seus concertos, apresentou um “improviso”. É certo, por todos desconhecido. Pediram bis, ao que o maestro respondeu: “Paganini nunca bisa”. Com isso, eu pretendia dizer que meu sermão não estava em script algum: era meditação pessoal. Nessas alturas já estava formado um grupinho interessado, participante. Prometi escrever algo do que falara.

Em breve introdução, a Trindade foi apresentada como comunidade de vida e amor. São três pessoas essencialmente distintas em um só Deus. A Trindade não é um tudo, soma de componentes que seriam o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Ela é comunhão das três Pessoas que se interpenetram. Em nome delas fomos batizados e iniciamos nossas celebrações, nossas atividades.

Ela será sempre desafio às nossas capacidades intelectivas. O principal, porém, é amá-la e vivê-la. Mas, nossas categorias mentais podem, embora imperfeitamente, ilustrar a vivência trinitária e como fazer com que ela aconteça no nosso dia a dia. Procurei exemplos para me explicar:

A operação 1+1+1=3 é comprovadamente correta e bastante útil em nossa vida. Todavia, tem suas limitações: não mostra toda verdade, a verdade completa. Imaginemos uma família pai+mãe+filho; se eles se odeiam, na verdade não acontece verdadeiramente a família. A identidade de cada membro permanece assegurada, mas não existe a comunhão. Cada um deles gostaria de estar longe dos outros. Sem amor, não há comunhão, inexiste a união. A individualidade de cada membro familiar está salvaguardada, mas, não a família que se fundamenta na comunhão.

Outra operação: 1+1+1=1. Parece estranha, mas existe. Foi dado como exemplo, o abacate, o copo de leite e a colher de açúcar; passados pelo liquidificador resultam uma saborosa “abacatada”, como alguém da comunidade batizou na hora. Todavia, cada um dos componentes deixou de ser o que era. O abacate, o leite e o açúcar formaram uma “unidade”, mas, em detrimento da identidade dos componentes. Assim, submetendo a família desunida acima recordada, à ação de uma betoneira, os membros familiares ficarão “perfeitamente” unidos (?!?!?!); salvou-se a “união”, em detrimento da identidade de cada um deles. Pai, mãe e filho se diluíram no todo. Não se odeiam mais; todavia, jamais se amarão!

Última operação: 1+1+1= Comunhão. Não há algarismo a mostrar o resultado da soma. Na verdade, porém, “comunhão” não é fruto da soma dos componentes. Estes, ao contrário, precisam ser amalgamados pela comunhão que os une. Mas, o exemplo mostra que é vital salvaguardar os dois elementos essenciais: a comunhão entre todos e a identidade de cada componente.

A operação, então, não retrata a Santíssima Trindade. Como se falou, ela é, antes de tudo, comunhão na qual existe a distinção das Três Pessoas. Aliás, nenhum ser vivo é soma de seus componentes; “antes” deles existe um misterioso todo. A árvore não é fruto do somatório de raízes, tronco, galhos e folhas pré-existentes. Ao contrário, é comunhão na qual os elementos elencados passam a ter o seu ser e o seu agir em benefício do todo. Nela, é um por todos e todos por um.

Insistiu-se que a Santíssima Trindade merece ser refletida. A reflexão a enriquece, mas, ela continuará sendo mistério desafiador. O importante é que, além de ser refletida, ela seja vivida.

Em primeiro lugar, é de tomarmos consciência: somos templos vivos de Deus, moradas do Espírito Santo (1Cor 3,16-17), templo a ser cada vez mais adornado e dignificado. É de se reconhecer, ainda, que o mistério acontece no coração de todos, os quais devem ser assim acolhidos.

A seguir, é de se tomar a própria família com núcleo a se viver a espiritualidade trinitária. Cada membro deve assumir a própria identidade em benefício próprio e em função dos demais, evitando qualquer aniquilação. O pai abraçando o que lhe é próprio, tudo fazendo para que a mãe e os filhos sejam eles mesmos no ser e no agir. É de acontecer o mesmo com os demais membros que, à imagem das Pessoas da Trindade, serão comunhão, respeitando as identidades e até fomentando e auxiliando para que atinjam a sua razão de ser. Assim, a comunhão será dinâmica.

O mesmo é de se dar na sociedade, no trabalho, na comunidade paroquial, etc. E assim acontecendo, a Trindade está sendo fonte de luz, de santificação, de amor e de comunhão.

É o melhor recurso para se “conhecer” a Santíssima Trindade: Pai, Filho e Espírito Santo.