Solidariedade na dor

Texto de P. Alcides Marques, CP

Como é que você se sente diante do sofrimento dos outros? Ele o atinge ou não? Se não atinge: o que está acontecendo com você? O que tem acontecido com os seus melhores sentimentos? Caso o sofrimento dos outros te atinge: em que proporção? O que tem provocado em você? Você consegue se sentir feliz sabendo do sofrimento de tanta gente e, particularmente, de pessoas que você conhece? Não é fácil lidar com esta questão. Se já é difícil aprender a conviver com o próprio sofrimento, quanto mais com o sofrimento dos outros. É sobre este tema espinhoso que vamos refletir. “Eu só peço a Deus que a dor não me seja indiferente” (Mercedes Sosa).

São Paulo Apóstolo, na carta aos romanos, apresenta aos cristãos o desafio da solidariedade em duas direções: “alegrai-vos com os que se alegram, chorai com os que choram” (Rom 12,15). Solidariedade na alegria e solidariedade na dor. No momento, vamos nos deter na questão da solidariedade na dor. Gostamos de repetir que é na hora da dor que descobrimos quem são os nossos verdadeiros amigos. “Amigos certos se conhecem nas horas incertas”. Mas também deveríamos pensar que é exatamente nestes momentos que os “nossos” amigos também gostariam da nossa solidariedade. Para o outro, o próximo é você.

O que seria a solidariedade na dor? Um mero sentimento, ou seja, um sentir mal diante da simples constatação de que o outro sofre? Palavras? Ou será que vai além? Nós cristãos temos um critério para ir trabalhando os nossos sentimentos. E esse critério é Jesus Cristo. Amar como Jesus amou. Na parábola do Bom Samaritano, Jesus nos ensina que a solidariedade se constrói com a compaixão. Lc 10, 33: “Certo samaritano em viagem, porém, chegou junto dele, viu-o e moveu-se de compaixão”. O que aconteceu? Um aproximar-se do outro, um ver o outro, um deixar-se guiar pela voz do coração.

A compaixão implica desenvolver a capacidade de sentir a dor alheia, “sofrer (=pathos) com”. Isso não é a mesma coisa que ter dó ou pena. Parece que estes sentimentos são de quem está numa situação de superioridade diante de outro tido como inferior. Na compaixão, não tem essa história de superioridade e inferioridade. Ela brota da consciência de que somos iguais. O compassivo não se sente superior a ninguém. Por isso mesmo é que é compassivo. Ele sente a dor alheia como se fosse sua. “Chorai com os que choram”.

O sofrimento (da solidariedade) não é sofrer o sofrimento do outro. Ninguém precisa sofrer junto com o outro. Jesus nunca falou que devemos carregar a cruz dele (Jesus) e nem a cruz dos outros. O que Jesus pede é que cada um carregue a própria cruz. “Se alguém quer vir após mim, renuncie a si mesmo, tome SUA cruz cada dia e siga-me” (Lc 9,23).

A solidariedade implica outro tipo de sofrimento: o sofrimento de se deixar afetar pela dor alheia, o sofrimento de buscar palavras libertadoras, o sofrimento de fazer alguma coisa por aquele que sofre. Quem é solidário fatalmente vai se sentir limitado diante das exigências da fraternidade. Isso não é sofrer o sofrimento do outro, mas acolher o sofrimento que vem da solidariedade. O sofrimento do Bom Samaritano foi o risco que ele correu. Ele teve que vencer o medo para amar efetivamente. O Samaritano também “perdeu” uma quantia de dinheiro.

A solidariedade na dor, portanto, deve necessariamente desembocar em algum tipo de ação. Uma ação que brota não de considerações racionais, mas da capacidade de se aproximar, ver e deixar-se conduzir pelo que de melhor existe dentro de nós.