Texto de P. Alcides Marques, CP
Não é segredo pra ninguém que o papa Francisco está conduzindo o seu pastoreio da Igreja católica num tom de maior abertura aos desafios dos tempos atuais. Poderíamos dizer que ele está preparando a Igreja para algumas fortes mudanças. Mas mudanças em que direção? Certamente na direção de colocar a Igreja em maior sintonia com os tempos atuais. Quais mudanças? Ainda não sabemos. Quando? Também não sabemos. Como então encarar mudanças futuras na Igreja? Do mesmo jeito que as mudanças no passado foram encaradas. Com cuidado e coragem.
Depois do Concílio Vaticano II (1962-1965), ocorreu algumas mudanças na vida da Igreja. Por exemplo. Antes do Concílio, a missa era celebrada somente em latim; depois, nas línguas vernáculas: inglês, francês, português etc. Antes do Concílio, os padres andavam de batina; depois, em trajes civis. E assim por diante. Nós católicos não podemos cair na ilusão de que a Igreja não muda. Ela já mudou muito no passado e seguramente vai mudar ainda mais.
A questão não é somente ir corrigindo este ou aquele ponto. Tem hora que a mudança precisa ser mais profunda. Quase uma revolução. Precisamos compreender de uma vez por todas que a Igreja é conduzida pelo Espírito Santo e que o Espírito Santo é quem vai ajudando a compreender toda a verdade. Não é possível, em uma determinada época da história, ter a compreensão total da verdade das coisas. Isso vale tanto para a humanidade em geral quanto para a Igreja em particular.
No quarto Evangelho existe uma passagem que fundamenta biblicamente a possibilidade de mudanças no decorrer da história: “Tenho ainda muitas coisas a vos dizer, mas não podeis compreender agora. Quando ele, o Espírito da verdade, vier vos conduzira à verdade completa” (Jo 16,12). Ou seja, Jesus anunciou toda a verdade para a época em que viveu, mas esta mesma verdade deve ser aprofundada no decorrer do tempo. E é o Espirito Santo em nós quem vai operar esta missão. Lembremos que o Espírito Santo é definido como o “Espírito da Verdade” (Jo 14,17).
O nosso Deus é um Deus que dialoga e dialoga segundo as nossas possibilidades de compreender. Jesus não tinha como falar em celular, usar computador, viajar de avião… É por isso que não há nenhuma passagem bíblica que fale destes equipamentos. O papa atual usa celular, computador e avião e não nos parece que ele está sendo infiel a Jesus por causa disso. É a presença atuante do Espírito Santo que nos garante isso. Se na época de Jesus, o avião não havia sido inventado, como ele poderia pedir aos discípulos que fossem de avião anunciar o Evangelho a todos os povos?
Na época do Concílio Vaticano II falava-se em “sinais dos tempos”. Particularmente o papa João XXIII. Este papa apontou três “sinais dos tempos”: a ascensão das classes trabalhadoras (sindicatos), a emancipação das mulheres e a luta das nações colonizadas pela independência. Por serem sinais, estes três movimentos indicariam uma direção para os cristãos repensarem a sua maneira de viver a fé. Isso valeria para a segunda metade do século XX e não, por exemplo, para o século XVI.
Voltando a questão das mudanças na Igreja, parece que o Papa Francisco quer mesmo nos preparar para as mudanças. Ele está querendo dizer o seguinte: primeiro nós devemos nos preparar para a possibilidade de mudanças, depois é que devem acontecer as mudanças. Seria um erro provocar mudanças, sem que os cristãos estejam preparados para tal.
Qualquer tipo de mudança? Não. As mudanças devem sempre levar em conta a caminhada histórica de 2000 anos. A nossa fé é coletiva tanto no espaço quanto no tempo. Os valores cristãos devem ser preservados, pois são frutos da vida de fé de muitos cristãos do passado. Mas não podemos ter medo de ir em frente. Você se sente preparado (a) para as possíveis mudanças que ocorrerão na Igreja?