Texto de P. Alcides Marques, CP
Uma das questões que mais tem trazido problemas de consciência e relacionamento, é a que se refere a algumas intervenções no corpo humano tidas por alguns como simples moda e por outros como um comportamento agressivo e até mesmo vinculado às forças diabólicas. É claro que estamos falando especificamente dos cristãos católicos. Mais precisamente, a questão que se coloca é a seguinte: o jovem católico pode fazer tatuagem, usar piercing, pintar o cabelo de verde, vermelho ou azul? É a tradicional questão do pode ou não pode.
Nós estamos muito acostumados com a moral do permitido e do proibido. Tipo assim: algumas atitudes e comportamentos são em si mesmos permitidos e outros, proibidos. Nós não os relacionamos com as pessoas e com o significado dos mesmos. Vejamos o caso das tatuagens. Será que todas as tatuagens têm como objetivo agredir as outras pessoas ou manifestar algum tipo exotérico de concepção de vida? Houve o caso de um pai que tatuou no seu corpo a imagem do filho assassinado. O gesto deste pai é digno de aplauso ou de condenação? E como você já deve estar observando, tais práticas precisam ser vistas no significado que as pessoas pretendem dar a elas. E nós não temos como dizer de antemão que fazer tatuagem, por exemplo, é um ato bom ou não. Sempre vai depender do significado que é dado.
Vamos recorrer à Sagrada Escritura. Particularmente ao apóstolo São Paulo. Na época de São Paulo, as carnes dos animais sacrificados aos ídolos pagãos eram posteriormente vendidas no mercado por um preço bem mais em conta do que as carnes não oferecidas. A questão que foi colocada para São Paulo era se os cristãos deveriam ou não comê-las. Então o Apóstolo apresenta o seu princípio ético de avaliação das coisas: “tudo é permitido” (1Cor 10,23). Isso mesmo! Para os cristãos “é proibido proibir” (Caetano Veloso). Traduzindo: não há nada que em si mesmo seja proibido. Acabou a moral do permitido e do proibido. Quem bom! Bom não, ótimo!
Mas existe um “porém”. A questão decisiva não é se algo é proibido, mas se constrói, edifica. Por isso, São Paulo continua: “Tudo é permitido, mas nem tudo edifica” (1Cor 10,23b). Existe aqui um critério: aquilo que constrói. Voltando ao caso do pai que fez a tatuagem do filho, poderíamos dizer que tal gesto constrói, edifica. Constrói porque testemunha para todos os outros pais o que significa amar um filho; constrói porque ensina que o amor verdadeiro é eterno e que nada neste mundo vai destrui-lo. Do ponto de vista paulino, é permitido sim a este pai fazer esta tatuagem.
São Paulo aclara ainda mais a questão. Tudo me é permitido desde que eu leve em conta não os meus interesses, mas os do próximo. O critério é o amor, a fraternidade. Tudo o que contribui para a fraternidade é permitido. Então, se ao comer carne sacrificada aos ídolos eu não agredir a consciência de ninguém, eu não estou errado. No entanto, se agredir a consciência do outro, eu deveria evitar tal comportamento. Em nome do amor. O essencial para o cristianismo é o amor. A pergunta não é se devo ou não comer carne sacrificada, mas se ao comer eu contribuo para a fraternidade. Isso é que é edificar, construir.
Alguns jovens cristãos podem achar que determinada tatuagem e piercing podem ajudá-los a serem “mais iguais” e assim facilitar a propagação dos valores cristãos aos outros jovens. Outros podem achar que determinada cor de cabelo cai bem e acentua uma maneira original de ser. Isso seguramente edifica. Mas, os mesmos devem pensar que nem todo tipo de tatuagem e piercing contribui para a fraternidade cristã. Alguns são agressivos e ofensivos à consciência alheia. E a consciência do outro, segundo São Paulo, deve sempre ser levada em conta. Que o amor sempre vença.