Texto de P. Mauro Odorissio, CP
Tenho consciência de que, às vezes, ao intitular os meus artigos, tenho ido além do permitido, como pode estar acontecendo agora, com o “rezar para não REZAR”. Cabe-me pedir as devidas desculpas.
Às vezes, a “criança nasceu”, urge ser registrada e não há denominador comum quanto ao nome. Não se exclui ainda, a falta de melhor opção no momento. Mas, entre outras possibilidades, pode haver o desejo de impactar, de chocar, e assim melhor vender o produto. E é o que acontece, agora.
Antes de outras lucubrações mais abstratas, permitam-me ser prático (uma de minhas carências).
É comum o chavão que sempre há diálogo entre o escritor e o leitor. Acredito que haja esforço; mas não sei se sempre acontece. Vejo-me, agora, só eu falando. Por mais que eu desejo, não sinto a mínima interação entre vocês e eu. Sorte minha. Diferentemente teria que escutar umas e boas. Mas, em contrapartida, eu ganharia muito pela riqueza que receberia.
Agora, vamos ao assunto. Imaginem-me indo a vocês para “bater papo”, mas sem lhes dar a menor chance de falarem. Chamariam a isso de conversa, de diálogo? Não seria puro monólogo?
Passemos do exemplo ao exemplificado: alguém “vai rezar” com mil orações decoradas ou impressas, com listas de lamúrias e pedidos a Deus. Poder-se-ia chamar isso de “diálogo” com ele? Sob o nome de oração ou de diálogo não estaria acontecendo fastidioso, improdutivo e impositivo monólogo?
Então, vamos por partes.
Como ponto de partida em nossa vida oracional está a oração “vocal”. O nome vem de “voz”; então é a que fazemos “com a boca” ao rezarmos o Pai Nosso. Como tal, essa prece pode ser apenas ruído sem a menor sintonia ou comunhão com o que “vai na mente” ou “no coração”. Assim sendo, a oração vocal seria mero ruído sem sentimento, sem vida, sem envolvimento. Neste caso o “orante” pouco mais seria do que um papagaio ou um disco. E não poderíamos identificar o ato como “oração”. Que nossa oração vocal, tão usada e valiosa, esteja longe de tão triste retrato.
Que tal darmos um passo ascendente na escada oracional assumindo, também, a meditação? Trata-se também de oração, mas feita com a “boca fechada”. Nela usamos mais a inteligência, a reflexão, o pensamento. Pensaríamos Deus, refletiríamos Deus. Convenhamos: com ela a oração se torna menos mecânica e mais envolvente, pois parte mais de nosso interior.
Grandes orantes e mestres de oração, como S. Tereza D´Ávila, S. João de Cruz e outros, consideram a oração vocal e a meditação como a “oração dos imperfeitos”. Estranho, não é? Mas é real.
Os que me conhecem e que no momento me leem, queiram me perdoar pelo repeteco ou pela insistência no exemplo: há pessoas que estudam seres tidos por não dignos ou repugnantes, como o rato, a barata. A inteligência de tais pessoas está completamente voltada a esses seres. Conhecem tudo deles, mas quem sabe, para eliminá-los. Não significa que morram, necessariamente, de amores por eles.
Então, a meditação, o estudo de Deus e das coisas a ele atinentes, por mais aprofundadas e úteis que venham a ser, não levam os estudiosos ou meditativos a envolvimento amoroso com ele. Meditar ou refletir, em si, exigem certo distanciamento. O envolvimento pode comprometer a reflexão isenta.
Sim, a meditação é algo mais do que a oração vocal, mas ainda é bastante imperfeita e limitada.
Já recebi o sinal amarelo dizendo que meu espaço chegou ao fim. Sinto-me envergonhado, pois fiquei quase que só no negativo e, em meus primeiro passos filosóficos, aprendi, na lógica, que a definição jamais deve ser negativa. Pouco ou nada digo ao afirmar que pão não é pedra.
Então, sinto-me na obrigação de voltar ao assunto. E é o que prometo fazer contando com a graça de Deus.
Mas, como obrigação de casa peço que pensássemos: nossa oração vocal seria mero e indefinido “blá-blá-blá”, portanto, truque para reduzir Deus ao silêncio e a meditação mera recreação acadêmica?
Rezemos para não nos contentarmos com a oração dos chamados “imperfeitos”. Mas que, com a graça de Deus estejamos abertos a passos mais altaneiros.