Ensinar os ignorantes

Texto de P. Alcides Marques, CP

A racionalidade é uma das características fundamentais do ser humano. Não é a única, mas seguramente é necessária para a existência humana. Em outras palavras, sempre precisamos aprender coisas novas; incorporar novos conhecimentos. Não é à toa que os sites de pesquisa são os mais visitados na internet. “O coração inteligente adquire o saber, o ouvido dos sábios procura o conhecimento” (Pr 18,15). A nossa saúde mental depende disso. Um dos mais fortes sinais do envelhecimento de uma pessoa, é a sua incapacidade de aprender coisas novas.

Ensinar os ignorantes é uma obra de misericórdia, um ato de amor; sobretudo para com as pessoas mais fragilizadas pela vida. Observe o quanto você gosta, quando por ocasião de uma consulta médica, que o profissional te ensine detalhadamente como se comportar frente a um problema de saúde. Ao contrário, quando o médico nem olha direito pra você e rapidamente passa exames ou remédios, a impressão que fica é que você esteve diante de um mercenário e não de um profissional da saúde. Se quando você precisa, você gosta que alguém te ensine, pense também nas pessoas que estão precisando de sua ajuda para adquirirem mais conhecimento das coisas.

A palavra ignorante não é lá muito agradável entre nós. Algumas vezes, ela se torna uma forma de xingamento, referindo-se a uma pessoa estúpida, grosseira, agressiva. Na verdade, porém, não deveria ser assim. Todos nós somos ignorantes em alguma coisa nesta vida. Ignorar é não saber. Observe que quando você pede uma informação numa repartição ou na rua ou no trânsito, você está admitindo que é ignorante em relação àquilo que procura.

Ninguém nasceu neste mundo simplesmente para ensinar. Todos nós precisamos ensinar e aprender. Ter a capacidade de aprender e ter a disponibilidade de ensinar. Se adotamos uma postura de quem não tem nada que aprender dos outros, também não teremos condições de ensinar. O ensinar não é um procedimento de quem se julga melhor do que os outros, mas de quem está partilhando uma experiência de vida.  É um ato de amor, de misericórdia; não uma maneira de engrandecimento. É por isso que uma pessoa que não aceita aprender dos outros, também não tem nada que ensinar. Simples assim.

Acima utilizamos o exemplo da consulta médica, mas, em nossas comunidades cristãs, precisamos também cultivar o hábito de ensinar as pessoas. Às vezes, nós não sabemos nem mesmo como nos comportar nas celebrações. Alguns de nossos catequistas, leitoras, coordenadores de pastoral não tem um mínimo conhecimento do que estão realizando. Infelizmente, trabalhamos muito na improvisação; na base da boa vontade. Também o trabalho de direção espiritual e confissão precisa de uma boa dose de ensinamento. O confessor não é apenas alguém que está ali para ouvir pecados. Precisa também ensinar as pessoas.

Jesus Cristo era chamado de Mestre. A cena de Nicodemos no Evangelho de João (3,1-21) é bastante iluminadora. Todos os discípulos de Cristo precisam de suas palavras; precisar frequentemente recordar de seus ensinamentos. A nossa vida depende Dele. “A quem iríamos, Senhor, só tu tens palavras de vida eterna” (Jo 6,68).

Vamos praticar mais esta obra de misericórdia? Vamos ajudar mais as pessoas, no sentido de transmitir às mesmas aquilo que é necessário para que elas possam aprender a lidar melhor com a vida e seus desafios?