Texto de P. Mauro Odorissio, CP
Em si, o provérbio é um tratado que, em poucas palavras, condensa grande sabedoria. Assim alguém, dotado de argúcia, leu a natureza e a sintetizou na breve sentença: “natura non facit saltum” (a natureza não dá salto). Realmente, as leis que a regem são suaves, embora nem sempre facilmente entendidas. Foi o que senti, no início deste dia, ao recitar o Sl 90[89]. No versículo 12 está a súplica que encabeça este artigo. Pode parecer esdrúxulo, mas o mundo que de per si é harmonia (kosmos), como há milênios chamaram-no os pensadores gregos, precisa de pessoas que tenham corações sábios.
É possível descobrir “sabedoria” latente a partir dos minerais, dos seres inanimados. Cada qual, ao seu modo, reage no seio da natureza. Por mais estáticos que pareçam, eles têm suas reações ou atrações que os caracterizam. Assim, de modo mais ou menos sistematizado, os seres humanos os conhecem e de tal conhecimento fazem uso na vida cotidiana. Sol e terra, entre si, se atraem e retraem.
Mais perceptível é a reação no mundo vegetal. Mesmo sem refletir de modo mais acuradamente, todos sabem que as plantas crescem em todas as direções: para o alto, para baixo, para os lados. Assim, força ou “conhecimento” inato fazem com que parte da árvore cresça em direção à terra; trata-se do geotropismo bem conhecido pelo botânicos. Outra parte da mesma planta cresce em direção oposta: para o alto. A luz solar faz com que ela se sinta atraída pelo foco luminoso do sol. Daqui o nome dado ao fenômeno: heliotropismo; a luz solar nela exerce atração preponderante que a leva a procurar as alturas. Além disto, sabedoria inata e distinguida a faz produzir flores e frutos no tempo preciso. Aquelas, ornamentadas por beleza inata e estes distinguidos com sabores irresistíveis.
Ainda na estrada do conhecimento, os animais dão saltos inacreditáveis. Sabem se movimentar de um lugar para o outro em vista do bem próprio e coletivo. Chegam a se locomover com precisão deslumbrante de um a outro continente. Até mesmo os estudiosos quedam-se boquiabertos ante fenômeno tão desafiador. Alguns animais se revelam possuidores da loquela como se fossem humanos. Contudo, eles têm limites marcantes, sobremaneira ante a transcendentalidade: apequenam-se na reflexão, principalmente ante o infinito que nem chega a vislumbrar.
É verdade que os humanos chegam a perpetrar vilezas não encontráveis em feras ferozes. Contudo, a eles é dada a razão e o raciocínio que parecem não ter limites; os humanos estão abertos ao transcendental, aos valores eternos.
Com esta constatação chegamos ao âmago de nossa reflexão. Sim! A racionalidade especifica e distingue os humanos. Com ela e dela surgem maravilhas. Todavia, quantos crimes, quanta maldade são dela originados. Gênios se servem de conhecimentos profundos para perpetrarem o mal. A inteligência e a cultura peregrinas tanto podem estar ao serviço do bem como do mal.
Aqui entra o nosso Salmista ao pedir a Deus ensinamento distinguido que procede não tanto da razão, mas do “coração sábio e santo”. Este é capaz de ter razões que a própria razão desconhece, como disse Pascal. Tal conhecimento se fundamenta no amor verdadeiro, o oblativo, que leva à imolação em prol do próximo, o originário do Crucificado (Jo 15,12-13). Tal amor leva a inteligência humana amiudadamente desvirtuada e colocada ao serviço do mal, a se reencontrar e assumir o bom caminho.
Como o Salmista, e mais do que ele por estarmos na plenitude da revelação, devemos suplicar a graça de termos mentes sábias, sempre abertas e a serviço da verdade. E, mais do que isto, que a súplica seja para que tenhamos corações capazes de acolher e irradiar o bem na face da terra. Desta maneira todos serão beneficiados pelos bens espargidos pelo Coração Divino. E a felicidade semeada em todos, será preâmbulo da prometida a todos os eleitos.
É, então, de suplicarmos como o Salmista: Senhor, ensina-nos a ter um coração sábio.