Lasciate ogni speranza

Texto de P. Mauro Odoríssio, CP

Uma reflexão em razão da morte de Umberto Eco (19 de fevereiro de 2016).

Ele é mais conhecido pela obra “O Nome da Rosa”. Mas tive a oportunidade de ler, também, “Em que creem os que não creem” que, em parte, contém correspondência epistolar entre ele e Cardeal Martini. A obra é recomendável para quem gosta de pensar, de refletir.

O intelectual italiano, na primeira carta, deseja saber como interpretar os “mil anos” que, segundo Apocalipse, seria o final do mundo. De antemão recordo: Milão parava quando Martini, que lá era arcebispo, fazia pronunciamentos. Todos sabiam que, daquele poço de cultura, só saía riqueza. Acrescento um dado que me é caro: o Cardeal, quando lecionava, foi reitor do Pontifício Instituto Bíblico de Roma, onde tive a ventura de me formar em exegese ou ciências bíblicas. Continue lendo “Lasciate ogni speranza”

Amar quem? Como?

Texto de P. Mauro Odorissio, CP

Instinto inato leva animais se procurarem como macho e fêmea. Contudo, o encontro não se dá da mesma maneira com todos; entre eles existem comportamentos diferenciados. Para olhos menos críticos tudo é igual; mas não para os dos estudiosos. Sendo comportamentos diferenciados, algo os leva a tanto. Que é? Sintamos o desafio do questionamento. Não sejamos superficiais. Continue lendo “Amar quem? Como?”

Deus age sim

Texto de P. Alcides Marques, CP

Quando dissemos que Deus, ao criar o mundo, abdicou de sua plena onipotência em favor da criação, poderíamos levar as pessoas ao equivoco de considerar que Deus não age e não interfere na obra da criação. O testemunho da Sagrada Escritura – tanto o antigo testamento quanto o novo – vai de encontro a tal suposição. O que dissemos é que Deus não age na história humana à semelhança de um diretor de filme ou de novela que manipula as pessoas e acontecimentos a seu bel prazer. O Deus da Bíblia é nosso parceiro, um Deus que caminha conosco, que faz história. Continue lendo “Deus age sim”

Não permite porque não pode

Texto de P. Alcides Marques, CP

O livro “A cabana” teve (tem) como objetivo apresentar uma luz para o terrível problema do sofrimento. Entendemos que de fato trouxe uma luz, mas uma luz ainda muito obscura, insuficiente. A tese central do autor é que Deus permite o sofrimento porque através do mesmo – com a Sua graça – sempre vai buscar atingir algum propósito bom. A nossa dificuldade de acolher tal sugestão vem do sentido do verbo permitir. Quando dizemos que Deus permite, estamos subentendendo que Deus poderia evitar. Continue lendo “Não permite porque não pode”

Rezar PARA REZAR

Texto de P. Mauro Odorissio, CP

Tenho plena consciência de estar em dívida com os caros leitores e leitoras. Há semanas escrevi um artigozinho intitulado: “Rezar PARA NÃO REZAR”. Mas o Natal se aproximava e precisei tecer alguma consideração sobre tão sublime mistério. Escrevi, então “O Natal histórico e o teológico”. Retorno, agora, ao tema sobre a oração e espero, na medida do espaço, completá-lo. Continue lendo “Rezar PARA REZAR”

O Natal histórico e o teológico

Texto de P. Mauro Odorissio, CP

Há diferença entre o Natal histórico e o teológico?

Sim! O primeiro aconteceu em circunstâncias irrepetíveis. Mais precisamente: deu-se num lugar fixo, abarcou distintas circunstâncias temporais e envolveu determinadas pessoas. Como tal, de há muito se encerrou no tempo e no espaço; trata-se de dado histórico único. Continue lendo “O Natal histórico e o teológico”

Ainda a cabana e ainda o sofrimento

Texto de P. Alcides Marques, CP

O livro “A cabana” de William P. Young trouxe uma visão extremamente interessante da Santíssima Trindade (Papai, Jesus e Sarayu), mas progrediu pouco no que diz respeito ao seu objetivo principal: refletir sobre o sofrimento humano. Pouco porque, embora tenha proporcionado um avanço no que diz respeito às concepções mais tradicionais, não chegou a uma contundência maior. E não chegou porque provavelmente não tinha como chegar. Assim sendo, precisamos percorrer um caminho espinhoso, mas não temos alternativa. A menos que queiramos viver eternamente neste curto-circuito entre a experiência do sofrimento e nossa capacidade e possibilidade de refletir sobre o mesmo. Continue lendo “Ainda a cabana e ainda o sofrimento”

Rezar para não REZAR

Texto de P. Mauro Odorissio, CP

Tenho consciência de que, às vezes, ao intitular os meus artigos, tenho ido além do permitido, como pode estar acontecendo agora, com o “rezar para não REZAR”. Cabe-me pedir as devidas desculpas.

Às vezes, a “criança nasceu”, urge ser registrada e não há denominador comum quanto ao nome. Não se exclui ainda, a falta de melhor opção no momento. Mas, entre outras possibilidades, pode haver o desejo de impactar, de chocar, e assim melhor vender o produto. E é o que acontece, agora. Continue lendo “Rezar para não REZAR”

A cabana, a trindade e o sofrimento

Texto de P. Alcides Marques, CP

O livro a Cabana de Willian P. Young alcançou um sucesso de vendagem e, mais ainda, de impacto, tendo em vista a densa temática que aborda. Simplesmente refere-se a um homem, Mackenzie, chamado de Mack, que perdeu tragicamente sua filha de oito anos, Melissa (Missy), vítima de estupro e posteriormente assassinada por um serial killer. Ele estava em um passeio com a família e a sua filha foi atacada covardemente e levada a uma cabana, onde teria sido assassinada. O resultado desta trágica experiência foi o surgimento de um homem acabado, triste, isolado e sem rumo.

Até que um dia ele recebe um bilhete de alguém que assina Papai e que pede que ele vá até a cabana onde sua filha foi assassinada. Ele se espanta como o convite, mas acaba se dirigindo até a Cabana onde encontra com a Santíssima Trindade em forma de pessoas concretas: o Pai, que é chamado de Papai, aparece como uma mulher negra; o Filho, Jesus, aparece como um moço alegre; e o Espírito Santo, chamado de Sarayu, aparece como uma mulher sem forma definida.

A força do livro está nesta maneira de abordar a Santíssima Trindade. O autor não pretende fazer uma reflexão teológica sobre a Santíssima Trindade, mas sim apresenta-la em sua proximidade máxima com um ser humano. É a Trindade que dialoga com o ser humano; que convida a uma refeição. Deus Pai é chamado de Papai, o modo como o próprio Jesus de Nazaré chama a Deus, Abba. Mas além de utilizar o termo que indica proximidade, a forma concreta como Papai se apresenta é surpreendente: na forma de uma mulher (mãe) negra. Mack teve uma experiência negativa do seu pai humano, que bebia e batia nele. Quando Papai se apresenta como uma mulher negra, ele se mostra em sua face amorosa, de dedicação, de cuidado. Recompõe para Mack o lado saudável de uma existência coletiva (familiar). A refeição em comum será a expressão maior desse convite à fraternidade. Uma fraternidade que envolve Papai, Jesus e Sarayu.

Mas, apesar de tudo, o problema maior ainda persistia. Como este amor cuidado e esta fraternidade concreta, que Mack experimentava realmente em sua vida, poderiam conviver com o fato de que sua filha inocente foi cruelmente violentada e assassinada? Como combinar estas duas experiências: uma fortemente positiva e outra escandalosamente negativa?

O livro tentou oferecer uma explicação. Tentou porque na verdade só avançou um pouco e acabou retornando a uma visão tradicional de como se dá a ação de Deus na história humana. Mack aprendeu que Deus não programou e muito menos estaria feliz com o que aconteceu com sua filha.

Aprendeu que Deus permitiu. Mas permitiu por quê? É aqui que existe um pequeno avanço: permitiu não por permitir (ou seja, por não querer agir). Permitiu porque era possível atingir um propósito. Mack foi convencido a admitir que nas experiências mais trágicas da vida, Deus pretende através das mesmas atingir algum objetivo, mesmo que nós não saibamos qual seja. Difícil de digerir, mas confortante, não? Imaginemos as tragédias e catástrofes e as consequentes ondas de solidariedade que as mesmas desencadeiam. Não estaria aí o propósito divino?

Estaria então resolvido – do ponto de vista da fé – o problema do sofrimento humano? Infelizmente não. E esta é a fraqueza do livro “A Cabana”. Mas seria possível outra maneira de entender? Acredito que sim. Qual? Veremos…

Nada de novo sob o sol

Texto de P`. Mauro Odorissio, CP

A sentença que encabeça o artigo é bastante conhecida, mas não tanto a sua fonte (Eclesiastes ou Qohélet 1,9), e menos ainda o espírito que animava o autor ao escrever. Tudo o retrata experiente investigador. Contudo, a visão global do empreendimento o leva à frustração. Não grita, por estar carente de energia; então elabora o lacônico, mas altissonante epitáfio: “vaidade das vaidades… tudo é vaidade” (Ecl 1,1). Consderando-se descobridor da pólvora, constata que ela já detonara muitos monumentos. Continue lendo “Nada de novo sob o sol”